Preencha os campos abaixo para submeter seu pedido de música:
Título:
Nesta segunda-feira (9), o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, foi o primeiro dos oito réus a prestar depoimento no Supremo Tribunal Federal (STF) no processo que investiga a tentativa de golpe de Estado em 2022. Cid firmou acordo de delação premiada com a Polícia Federal e passou quatro dias se preparando para o interrogatório, revisando todos os seus depoimentos anteriores para evitar contradições e fortalecer sua colaboração.
Logo no início do depoimento, Cid confirmou que a acusação da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os réus é verdadeira, afirmando que “presenciou grande parte dos fatos, mas não participou deles”. Ele negou ter sido alvo de qualquer tipo de coação para firmar a delação, ressaltando que assinou o termo de colaboração por vontade própria.
Cid foi apontado pela PGR como integrante do “núcleo crucial” da trama golpista, atuando como porta-voz do ex-presidente Bolsonaro e transmitindo orientações aos demais integrantes do grupo. Segundo a acusação, ele teve menor autonomia decisória, mas participou da articulação para descredibilizar o processo eleitoral, inclusive por meio da obtenção de material com a ajuda de hackers.
Um dos pontos centrais do depoimento foi a confirmação de que Bolsonaro recebeu, leu e sugeriu alterações na chamada “minuta do golpe” — um documento que previa medidas autoritárias para reverter o resultado das eleições de 2022. Segundo Cid, Bolsonaro solicitou a retirada do trecho que previa a prisão de diversas autoridades, incluindo ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente do Senado e da Câmara dos Deputados. O principal alvo que permaneceu no documento foi o ministro Alexandre de Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Cid relatou que Bolsonaro “enxugou o conteúdo”, removendo a maior parte das ordens de prisão previstas inicialmente. O ex-presidente teria discutido o documento com o ex-assessor internacional Filipe G. Martins e um jurista, além de apresentar a minuta em reunião na biblioteca do Palácio da Alvorada, com a presença dos três comandantes das Forças Armadas.
Cid classificou os envolvidos na trama em três grupos distintos:
Conservadores: que aceitavam a derrota eleitoral;
Moderados: insatisfeitos, mas contrários a medidas inconstitucionais, incluindo ministros Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto;
Radicais: favoráveis a intervenção militar e ações armadas nas ruas, entre eles o comandante Almir Garnier.
Essa divisão demonstra que o grupo não era uma organização homogênea, mas sim um conjunto de atores individuais com diferentes graus de radicalismo e objetivos.
Durante o interrogatório, o ministro Alexandre de Moraes questionou Cid sobre áudios vazados em setembro de 2024, nos quais ele criticava duramente a Polícia Federal e o próprio Moraes, afirmando que o ministro “prende e solta” como quiser. Cid explicou que os áudios foram desabafos feitos em momentos íntimos e negou ter sido coagido a inventar informações durante as investigações.
Cid também esclareceu que prestou doze depoimentos à Polícia Federal, entre agosto de 2023 e dezembro de 2024, para esclarecer e confirmar os fatos relacionados à trama golpista.
Cid afirmou que, embora houvesse discussões sobre possíveis irregularidades nas urnas eletrônicas, nenhum ministro, assessor ou militar conseguiu comprovar fraudes eleitorais. As tentativas de encontrar provas baseavam-se em dados públicos do TSE, mas não resultaram em evidências concretas.
Ele confirmou ter presenciado reuniões reservadas entre Bolsonaro, a deputada federal Carla Zambelli e o hacker Gilberto “Delgatti” Rodrigues, para discutir supostas falhas de segurança nas urnas eletrônicas. Também relatou que o senador Marcos do Val teria prometido gravar ilegalmente uma conversa com Alexandre de Moraes para incriminá-lo, embora não soubesse detalhes sobre a participação da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) nesse plano.
Após o depoimento de Mauro Cid, o STF seguirá ouvindo os demais réus do chamado “núcleo crucial” da trama golpista, incluindo Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. Bolsonaro está previsto para depor entre quarta e quinta-feira, enquanto Braga Netto participará por videoconferência, já que está preso no Rio de Janeiro.
Os réus têm o direito de permanecer em silêncio, podendo optar por não responder a perguntas que possam incriminá-los, exceto Mauro Cid, que como delator não tem essa prerrogativa.
A investigação apura a tentativa de golpe de Estado articulada para impedir a transição de poder após as eleições presidenciais de 2022, que resultaram na vitória de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo envolve militares, ex-ministros, assessores e o próprio ex-presidente Bolsonaro, que é acusado de liderar o esquema que incluía a elaboração de documentos para justificar medidas autoritárias, ações para deslegitimar o resultado eleitoral e planejamento de prisões de autoridades.